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Ano IV • 1987-07-15 • nº 4 • Julho/Agosto |
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apresentação |
PETER STILWELL
Em nome da Verdade política, científica ou religiosa, quantas violências não têm sido, e são ainda, praticadas contra a integridade física, intelectual e moral da pessoa humana? As vítimas dessas arbitrariedades – sejam eles os perseguidos duma Inquisição ou duma Revolução Francesa; os dissidentes de regimes comunistas, ou os desaparecidos em nome da Segurança Nacional; ou ainda, aqueles que experimentam na carne a desumanidade mais subtil das nossas sociedades ocidentais – sempre tiveram, por isso mesmo, uma percepção aguda dos limites das "Verdades" que os excluem. Mas aqueles a quem essas "Verdades" servem vão alimentando uma inesgotável produção intelectual de carácter apologético que justifique a sua como "a Verdade verdadeira" e exponha de forma mais convincente a Mentira dos outros. É a "verdade funcionalizada"; a verdade feita ideologia. Dela nos falam Henrique Barrilaro Ruas e Peter Henrici.
Poderia parecer que, numa sociedade que preza a tolerância, esse risco já não existiria. É comum ouvir-se dizer que nela as Ideologias morreram. E, contudo, nessa própria afirmação se esconde uma cegueira que é sintoma da sua permanência.
Que é, afinal, a Verdade? Aquela que é dom, que liberta, e jamais se pode reduzir a critérios de utilidade? A Verdade que Jesus anunciou presente n'Ele mesmo, e que Pilatos não se dispôs a escutar? Três artigos abordam essa questão em perspectiva teológica. Trata-se dos textos de H.U. von Balthasar, A. Van Hoof, e ainda a curiosa reflexão de J.-R. Armogathe ao contrapor Sherlock Holmes ao Padre Brown para realçar as características da Verdade Católica.
Procurar a Verdade que a ninguém pertence, sem perder de vista a riqueza da nossa própria tradição, mas respeitando criticamente os valores dos outros, é um caminho de crescimento comunitário de que todos beneficiam. O denso artigo de José Branco é, neste sentido, um gesto significativo de diálogo com o pensamento de António Sérgio, cuja influência é viva em muitos dos nossos contemporâneos.
Uma curta entrevista com A. Greimas completa a série de artigos mais teóricos.
Como que a separar dos anteriores os artigos de carácter mais testemunhal, publica-se um trabalho de N. Lohfink sobre "Reino de Deus e Economia na Bíblia". Prolongamos nele a reflexão sobre a Doutrina Social da Igreja iniciada no número anterior da COMMUNIO.
O conjunto final de textos e testemunhos é introduzido por uma homilia do Padre Alberto Neto sobre S. João Baptista produzida na Capela do Rato em 1973, altura em que não era fácil dar estemunho da Verdade. Pelo texto se compreende como o impacto dessas homilias "históricas" se deveu não às eventuais opções ideológicas do pregador mas à força do Evangelho nelas servido por uma forma exemplarmente cuidada de exposição.
Mas dar testemunho da Verdade exige que se aprenda a caminhar nela. Um texto de F. Brague, mãe de família, lembra-nos que ensinar as crianças a não mentir não é só um treino de "boa-educação", mas condição da sua realização humana e crescimento espiritual.
Três testemunhos completam este número da COMMUNIO. Pacheco de Andrade fala-nos a partir da sua experiência dos meios de comunicação social. T.A.M. conta como acompanhou o Cardeal Joseph Mindszenty, da Hungria, quando este recusou vergar-se às conveniências políticas do momento. Por fim, Luísa Ribeiro Ferreira dá-nos a sua reflexão de filósofa sobre o filme "A Missão": relato de ficção histórica que nos recordou verdades sobre o nosso passado de Igreja e de país, que por vezes o tempo e os interesses fazem esquecer. |
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